Lula lidera em todos os cenários para 2018, segundo a pesquisa Datafolha divulgada no último domingo, apesar de todas as dúvidas legais que cercam sua eventual candidatura. O ex-presidente, no entanto, parece convencido de que não há razão jurídica para evitar que ele seja candidato nas próximas eleições. Do seu ponto de vista, seria um golpe. O segundo, pois o primeiro teria sido o ato que vitimou o mandato da ex-presidente Dilma Rousseff – o impeachment.
Nas sete eleições que disputou desde 1989, o PT venceu quatro, nenhuma delas no primeiro turno. Na última delas, em 2014, a ex-presidente Dilma teve uma vitória apertada sobre Aécio Neves, o candidato do PSDB. Passou raspando, como se costuma dizer. Além disso, Lula tem a mais alta rejeição entre os pré-candidatos a 2018, com 45%. Ainda assim o PT não tem Plano B, só o Plano A de Lula. É uma coletânea de riscos que dobram à medida do isolamento de Lula.
Lula sabe do que fala quando diz que não haverá uma razão jurídica para barrar sua candidatura. Mesmo se virar ficha suja por uma condenação da segunda instância, o que é previsível, Lula terá ainda à disposição uma série de recursos na esfera judicial. Há precedentes. Isso sem falar do Congresso Nacional, que pode recolocar todos no jogo aprovando uma anistia.
Ninguém sabe o que é a candidatura Lula para 2018
É provável que a eleição de 2018 seja um jogo com os candidatos já à vista. É difícil construir do zero uma nova candidatura a dezoito meses da eleições. E pessoas que hoje podem mandar prender ou soltar talvez não estejam tão interessadas por um lugar onde não podem mandar prender e muito menos mandar soltar alguém (só Eduardo Cunha parece não acreditar nisso).
Os nomes são os que já circulam na praça. E entre eles, o destaque é Lula, que não só mantém a liderança como ampliou a vantagem que dispunha na série medida pelo Datafolha, mesmo a última pesquisa apurada depois de conhecidas as delações da Odebrecht, nas quais é protagonista.
O desafio do momento é menos saber se Lula será candidato e mais qual é o Lula que pensa em voltar em 2018 a ocupar a Presidência da República. Em 2002 Lula tinha um projeto, que era a redistribuição de renda, discurso que expirou. Hoje o país dá sinais de que pode sair da maior recessão de sua história, mas não se sabe qual será o próximo passo nem de Lula nem da esquerda e o que eles querem colocar no lugar do que Michel Temer propõe para enfrentar a crise.
Se conseguir aprovar as reformas previdenciária e trabalhista, Temer terá feito a maior intervenção pró mercado na economia brasileira dos últimos 20 anos, pelo menos desde as privatizações de Fernando Henrique Cardoso. O PT fez uma pesquisa entre seus antigos eleitores da periferia, descobriu que o povão acredita no trabalho e no mérito, mas tem dificuldades para engolir o resultado.
A mesma pesquisa Datafolha que apurou Lula na liderança da corrida sucessória, também apurou que 71% dos brasileiros são contrário à proposta de reforma da Previdência em discussão no Congresso. O que comprova que o PT e a CUT cometeram um erro estratégico ao atar a greve geral da última sexta-feira ao partido, a Lula e ao depoimento que o ex-presidente, em princípio, daria ao juiz Sérgio Moro amanhã (Moro afinou e uma nova data foi marcada).
Para que a greve geral não fosse um fiasco, a CUT e congêneres estrategicamente paralisaram o setor de transportes e fizeram barreiras nas estradas, para impedir as pessoas de chegar ao trabalho. As cidades ficaram com ar de feriadão, o protesto ganhou cor e partido mas não ampliou, apesar do terreno fértil, como indicou a pesquisa Datafolha divulgada ontem pelo jornal “Folha de S. Paulo”.
Já na semana passada as centrais não tiveram competência ou engajamento suficiente para botar gente em frente ao Congresso para protestar contra a reforma trabalhista.
Há vídeos de procedência duvidosa que mostram atos hostis a Lula em meio a uma manifestação da CUT na Avenida Paulista. Se forem legítimos, o líder sindicalista tem com o que se preocupar à retaguarda. O desafio do momento é entender o que significam a candidatura Lula e sua volta à Presidência da República. Os sinais emitidos pelo ex-presidente muitas vezes parecem contraditórios, mas o fato é que ninguém sabe qual é o projeto de Lula para 2018.
Nas entrevistas e manifestações públicas, o ex-presidente tem abraçado tudo aquilo que condenava em Dilma e que levou a presidente destronada a pagar um preço pessoal muito alto (o mandato) e o Brasil a um desastre econômico nunca visto. Lula critica a reforma previdenciária de Temer mas não diz o que precisa mudar para fechar o ralo das contas da seguridade. Diz que com crescimento haverá aumento da arrecadação da Previdência, o que é certo, mais ainda assim haverá um buraco por cobrir.
Há quem diga que o Lula de 2017 é uma caixa-preta como era o Lula pré-2002, até assinar uma carta escrita a várias mãos – inclusive as da Odebrecht -, comprometendo-se com as reformas exigidas pelo mercado. Ninguém sabe o que vem com ela. Vingança? Apenas na economia, o Lula que hoje emerge das palestras e entrevistas parece mais próximo do segundo do que de seu primeiro mandato.
Numa reveladora entrevista ao repórter Kennedy Alencar, do SBT, Lula disse que o mercado financeiro “pode temer, sim” sua eventual volta ao Palácio do Planalto. Isso porque “o Banco do Brasil vai voltar a ser banco público, porque a Caixa Econômica vai voltar a ser banco público, porque o BNDES vai voltar a ser banco público”, disse o ex-presidente. “Ele [o mercado financeiro] tem que saber disso, tem que saber disso. Esses bancos [os bancos públicos] salvaram a economia em 2009”.
Quando se elegeu, em 2002, Lula não teve dificuldade para ampliar quando sentou na principal cadeira do Palácio do Planalto. A dúvida hoje é se ele terá a mesma condição para atrair para o governo gente como Roberto Rodrigues, que foi seu ministro da Agricultura, ou um empresário como Luiz Fernando Furlan, convidado para comandar a pasta da Indústria e Comércio. O discurso não bate.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
Fonte: Valor Econômico