Magistradas ligadas a golpe bilionário no BB podem ter aposentadoria cassada

Publicado em: 05/04/2018

Desde dezembro do ano passado, quando o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) condenou as desembargadoras paraenses Marneide Trindade Pereira Merabet e Vera Araújo de Souza à pena de aposentadoria compulsória, pela acusação de conduta negligente durante uma tentativa de golpe bilionário aplicada por uma quadrilha de estelionatários contra o Banco do Brasil (BB), as duas magistradas permanecem em casa, recebendo aposentadorias mensais em torno de R$ 34 mil. Cassar esse benefício, por entender que “a inatividade não pode ser um prêmio” para as desembargadoras, é o objetivo da ação civil pública ajuizada na última semana pelo procurador-geral de Justiça do Pará, Gilberto Martins, junto à Justiça local.

O envolvimento das magistradas no golpe teria ocorrido em outubro de 2010. Na ocasião, a então juíza Vera Araújo de Souza bloqueou R$ 2,3 bilhões do BB, em ação de usucapião. O autor do pedido disse representar um correntista que havia recebido o valor cinco anos antes, em oito contas, sem ninguém reclamar o dinheiro de volta. A quantia era equivalente a um terço de todo o lucro anual da instituição financeira. A petição inicial tinha só quatro páginas e dois extratos bancários, mas foi considerada suficiente.

ACUSADAS IGNORARAM ALERTAS, DIZ PROCURADOR

Ao justificar o pedido de cassação de aposentadoria, o procurador-geral de Justiça Gilberto Martins sustenta que as magistradas desonraram a Justiça ao proceder com parcialidade e desprezo às normas processuais e ao dever de cautela. Para ele, punição de um ilícito deve ensejar a perda do cargo e de qualquer vínculo com o Estado. Como o cargo de magistrado é vitalício, Martins entende que essa desvinculação com o Poder Judiciário somente se dá por meio de decisão judicial.

Embora os advogados do Banco do Brasil tenham demonstrado o absurdo do pedido, sustentado por fraude de falsificação de documentos e que se tratava do mesmo golpe já tentado junto à 5ª Vara Cível de Brasília, a então juíza Vera de Souza (posteriormente, promovida à desembargadora) manteve o bloqueio. Já a desembargadora Marneide Merabet negou o recurso apresentado pelos advogados após concluir que o banco não conseguiu comprovar que o bloqueio resultaria em “lesão grave de difícil reparação”.

De acordo com a ação, Vera de Souza, ao negar aos advogados o pedido de suspensão do bloqueio, em 2010, teria declarado “haver sofrido pressão de cima”, mas que encontraria os autos até então desaparecidos e logo analisaria os fundamentos do BB, “o que nunca fez”. O banco só conseguiu deter o golpe após formalizar um pedido de providências na Corregedoria Nacional de Justiça, que resultou na suspensão da ordem judicial de bloqueio e na instauração de reclamação disciplinar contra as magistradas.

As investigações encontraram na casa de um dos golpistas um telefone celular, em cuja agenda constava o nome da desembargadora Marneide Merabet (na verdade, o número pertencia à irmã dela) e de seu marido. A quebra do sigilo telefônico demonstrou que, em 20 de outubro de 2010, dias antes da distribuição da ação de usucapião especial, o dono da linha ligou três vezes para o número supostamente utilizado pela desembargadora Marneide Merabet. Depois que a ação foi protocolada, ligou outras 20 vezes.

No CNJ, a defesa das desembargadoras tentou, sem sucesso, barrar os processos alegando que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia julgado e considerado o caso prescrito na esfera criminal. O advogado Ophir Cavalcante, que defendeu Vera de Souza, procurado pelo GLOBO, alertou que a aposentadoria dos magistrados só pode ser cassada por decisão judicial transitada em julgado “em razão de expressa disposição constitucional”.

Fonte: O Globo

Desembargadoras punidas por negligência em golpe bilionário contra o BB

Publicado em: 14/12/2017

O Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) condenou terça-feira (12/12) as desembargadoras do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA) Marneide Trindade Pereira Merabet e Vera Araújo de Souza à pena de aposentadoria compulsória pela conduta negligente de ambas durante uma tentativa de golpe bilionário aplicada por uma quadrilha de estelionatários ao Banco do Brasil (BB) em 2010. O plenário aprovou por unanimidade o voto do relator do processo, conselheiro André Godinho.

O caso teve origem em outubro de 2010, quando um advogado acionou a Justiça para que o BB bloqueasse o suposto saldo de cerca de R$ 2,3 bilhões, depositados nas contas bancárias de um dos membros da quadrilha. Como prova da posse da fortuna, o procurador do grupo de estelionatários apresentou cópias de extratos bancários falsos. A então juíza da 5ª Vara Cível de Belém, Vera Araújo – mais tarde promovida a desembargadora – concedeu a liminar aos estelionatários e estipulou multa diária de R$ 2 mil para que o BB não movimentasse a soma bilionária.

O Banco do Brasil então alertou a magistrada sobre a fraude. Os advogados da instituição financeira informaram que o mesmo golpe fora tentado anteriormente contra o banco. No entanto, a juíza não se manifestaria formalmente a respeito até que, meses depois, os advogados dos golpistas desistissem da causa. Em janeiro de 2011, a juíza homologou a desistência.

Desvios funcionais

De acordo com o voto do relator do processo, conselheiro André Godinho, a juíza não usou de cautela e prudência, exigidas pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), em uma inusitada ação de usucapião de dinheiro. “Nota-se exacerbada negligência da magistrada no seu dever de cumprir e fazer cumprir com serenidade e exatidão todas disposições legais, seja ao deferir a medida liminar nas condições já descritas, seja ao quedar-se inerte face às irregularidades a ela relatadas”, afirmou.

Enquanto a magistrada não respondia, o BB recorreu ao segundo grau de jurisdição. Pediu o efeito suspensivo da decisão da juíza Vera Araújo. Os advogados apresentaram, inclusive, a condenação do mesmo grupo de estelionatários, por conta do mesmo golpe, pela Justiça do Distrito Federal. Mesmo assim, o pedido foi negado pela desembargadora Marneide Trindade Pereira Merabet, que ignorou inclusive laudos da perícia que atestavam a falsidade do documento usado como prova.

Segundo o voto do relator, a desembargadora Marneide demostrou “falta de prudência e cautela”, “manifesta negligência” e “parcialidade” na condução do procedimento judicial dotado de peculiaridades, conduzido por organização criminosa contra o sistema financeiro nacional.

Histórico

Em dezembro de 2010, a então corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, suspendeu por liminar a decisão da juíza Vera Araújo de Souza por identificar indícios de violação do Código de Ética da Magistratura. Seguiu-se uma sindicância que resultou em um pedido de abertura de Processo Administrativo Disciplinar, em maio de 2014. Por unanimidade, o PAD foi aberto e as duas magistradas, afastadas de suas funções.

O processo foi originalmente distribuído à então conselheira Gisela Gondim. O processo foi instruído, as testemunhas ouvidas e as provas colhidas pelo conselheiro Luiz Cláudio Allemand, cujo mandato encerrou este ano.

Defesa

Na sessão de terça-feira (12/12), coube ao novo relator do processo, conselheiro André Godinho, rejeitar as três preliminares apresentadas pela defesa para tentar impedir a condenação das acusadas. Os advogados alegaram que o fato de o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ter decretado a prescrição da ação penal contra as magistradas deveria evitar a condenação de suas clientes no plano administrativo, instância dos julgamentos realizados pelo CNJ. “Como a natureza da acusação no STJ – corrupção – não era a mesma da que analisamos no CNJ – desvio funcional –, a decisão do STJ não vincula os dois processos”, afirmou Godinho.

A defesa tentou ainda invalidar as provas ao atribuir um dos números de telefone celular, encontrado na agenda de um dos estelionatários presos pelo golpe, a uma irmã da desembargadora Marneide, falecida em 2013. Segundo o voto do conselheiro Godinho, a quebra do sigilo telefônico da quadrilha apontou três ligações feitas ao telefone registrado de fato em nome da irmã da magistrada, mas também outras 20 ligações feitas ao marido da desembargadora à época da tentativa de estelionato. “Nota-se que a magistrada não logrou êxito em apresentar justificativas plausíveis para desvencilhar-se de forma categórica das provas que atestam de contato e proximidade da quadrilha de estelionatários com a desembargadora e com familiares”, afirmou o relator.

Segundo o corregedor-geral do Ministério Público Federal (MPF), Oswaldo José Silva, que representou o órgão na sessão plenária de terça-feira (12/12), a conduta das magistradas merecia punição. “Eu queria lamentar que, da tribuna, o advogado da desembargadora Marneide ache normal dizer que a culpa não é da Marneide, e sim da irmã. Para se safar de uma negligência, de uma falta de cautela, dizer que o telefone era da irmã e que possivelmente até a irmã possivelmente participaria das irregularidades. Isso para as relações familiares é muito triste”, afirmou Silva.

De acordo com a última preliminar, também negada, houve morosidade na condução do processo e algumas das provas relativas à ação “pereceram decorrente ao enorme tempo de apuração”. Ao longo de três anos de apurações, o processo acumulou cerca de 90 mil páginas, segundo o conselheiro Godinho. Cabe registrar que o PAD tramitou no tempo razoável dada a complexidade da matéria e da enorme quantidade e complexidade de documentos probatórios, sendo que a maioria deles foi requerida pelas próprias magistradas”, disse Godinho.

Absolvição

Na mesma reunião planária da manhã de terça-feira (12/12), o CNJ absolveu por maioria o desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), Claudionor Miguel Abss Duarte, da acusação de integrar sociedade empresarial, o que é vedado por lei. A relatora original do processo administrativo disciplinar e então conselheira, Ana Maria Amarante, votou pelo arquivamento do caso, quando o julgamento foi iniciado, em 2014. Antes de ser interrompido por um pedido de vista, três outros conselheiros aprovaram o voto da relatora na 21ª Sessão Extraordinária, realizada em 28 de novembro de 2014.

Três anos depois, na 264ª Sessão Ordinária, o conselheiro Fernando Mattos, que pedira vistas do processo, apresentou seu voto com a mesma solução da relatora original, pois não comprovou materialidade nas provas usadas na acusação. Segundo o conselheiro, não houve “concorrência de profissões” (pecuarista e magistrado) e a atividade de fazendeiro também não atrapalhou o trabalho de magistrado, conforme comprovado por estatísticas de produtividade apresentadas ao longo do processo. Votaram com o relator os conselheiros Arnaldo Hossepian, André Godinho, Henrique Ávila, ministro João Otávio de Noronha e Valdetário Monteiro. A divergência aberta na sessão passada pelo conselheiro Márcio Schiefler foi seguida pelo conselheiro Rogério Nascimento e pela presidente, ministra Cármen Lúcia. Processo Administrativo Disciplinar 0000880-65.2013.2.00.0000.

Fonte: Tudo Rondônia